Escrevo direto do encontro de comemoração da data no Ministério do Planejamento para transmitir o sentimento do local. Ao ver o Projeto completar 5 anos, é inevitável para mim, que sou parte desde o início, fazer uma retrospectiva de tudo o que passamos para chegar até aqui.
Em conversas com a minha esposa, que é leiga na área de informática, vejo que a maior parte dos cidadãos não têm ideia de como as coisas acontecem no lado de quem presta o serviço dentro do Governo. A imagem que o público tem, quando se trata de prestação de serviço, é de alguém que está do outro lado sentado sem muita vontade de atender suas demandas. Mesmo sabendo que o cenário existe, durante os anos em que estive diretamente envolvido com o Projeto posso dizer que tal cenário passa longe da estrutura pessoal e técnica que envolve o Portal do Software Público. Encontrei sempre pessoas muito dispostas e preocupadas em atender a população brasileira (e agora mundial) da melhor forma possível com os pucos (sempre poucos) recursos disponíveis.
A parte técnica do Portal sempre foi mantida por uma equipe bastante reduzida, no máximo duas ou três pessoas, cujo desenvolvimento e manutenção do portal não era sua única responsabilidade. Quando penso nisso lembro sempre da frase que minha esposa uma vez me disse: “Por que o seu portal dá tanto problema? Os outros portais de Internet não caem tanto assim.” Qualquer administrador de sistemas vai rir ao ler essa frase, mas ela faz todo o sentido e nos leva a pensar sobre as razões pela qual executamos nosso trabalho. Todo Portal de Internet sofre problemas de disponibilidade, grande ou pequeno, mas para quem está usando o impacto tem diferentes proporções. Se estamos lendo um grande portal de notícias como UOL ou Terra e temos um problema de conexão, simplesmente acessamos alguns minutos depois. Contudo, se estamos precisando de um serviço público e há algum problema de disponibilidade, nos sentimos ao mesmo tempo lesados e ofendidos.
Lesados porque estamos pagando nossos impostos e não temos o serviço pelo qual pagamos; ofendidos porque imaginamos um funcionário público tomando café na tomada do servidor, tal qual o operador bastardo do inferno. Em uma entrevista do Mark Zuckerberg (vou ficar devendo o link), pra quem não sabe o criador do Facebook, vi ele fazendo uma relação entre o número de usuários e o número de desenvolvedores. Ele citou que a empresa sempre teve uma relação de um milhão de usuários para cada desenvolvedor, e que chega um ponto em que o número de usuários não acarreta em mais desenvolvimento. Há outros fatores a serem levados em consideração, mas imaginando o Portal do Software Público com um milhão de usuários e somente um desenvolvedor me dá vontade de rir e chorar. O facebook já está se tornando um serviço público, mas certamente não há a mesma preocupação em atender o cidadão como na maior parte dos serviços de Governo.
Contudo, mesmo sabendo das dificuldades técnicas, estou muito orgulhoso por termos chegado até aqui. Por mais que elas fosse grandes, nem de longe foram as maiores que encontramos no caminho. A maior delas, sem dúvida, é a comunidade. Já escrevi por aqui que estamos ajudando a enterrar o Software Livre, porque o desenvolvimento colaborativo traz o que há de melhor e de pior em nós como pessoas e como grupo social. Perdi mais tempo tendo que explicar à comunidade a necessidade de um usuário se cadastrar ao baixar um software do que apresentando o modelo aos empresários do setor e à sociedade em geral. Os encontros de Software Livre, com raríssimas exceções, se tornaram uma espécie de clube fechado onde nos reunimos para rir de nós mesmos e encontrar os amigos (a parte boa), além de defender seus projetos e ideias acerca desse e daquele software (a parte ruim). As pessoas não conseguem entender que NÃO IMPORTA se este ou aquele software é melhor, NÃO IMPORTA se este ou aquele portal é melhor. O importante é que seja livre de verdade, e não apenas um código livre em um ambiente fechado. Colaborar é produzir, não apenas falar, como já aprendemos com o nosso amigo Jomar.
Todas essas brigas e flames geraram um fenômeno muito ruim, e me arrisco a dizer que se não fosse o Portal do Software Público o Software Livre como negócio já estaria morto no Brasil. Vale ressaltar, contudo, que trabalhar com software público traz um paradigma que as empresas brasileiras ainda não estão acostumadas: não basta ter, é preciso ser. Num ambiente de colaboração aberto você vale o que sabe, e não o portfolio de produtos que possui. Enquanto ainda estava no Governo recebi visitas de muitos empresários, com um discurso sempre igual: temos aqui a nova solução para os seus problemas, mas agora ela é livre. O caminho NÃO É ESSE. Adicionar um produto ao portfolio não diz nada sobre o conhecimento do software se ele não for acompanhado de uma grande colaboração na respectiva comunidade. A maior contribuição do Portal é essa: o ambiente pertence à comunidade brasileira, e para sermos alguém precisamos contribuir com ele.
Para finalizar, gostaria de agradecer à todas as pessoas que trabalhei no Projeto, em especial aos que me deram a primeira oportunidade: Corinto Meffe e Rodrigo Proença. O Corinto é o coração do Portal, e o Rodrigo foi a pessoa que tornou isso possível. Vale fazer uma menção honrosa ao amigo Paulo Fresneda, que doou o Portal à sociedade brasileira. Que sejam mais 50 anos de colaboração e muito código livre!
🙂
Foi um prazer inenarrável acompanhar teu trabalho no Portal do Software Público. 😀
Obrigado Fike,
Eu que agradeço pelos ensinamentos. As conversas que tivemos ajudaram a montar a estrutura que temos hoje.