Ainda na esteira do caso Aaron Swartz, li uma daquelas que talvez tenha sido a mais simples e profunda manifestação de pesar pela sua morte, emitida na lista Transparência Hacker Brasil:
Soldier down
Sim, o sentimento é de estar em uma guerra e perder um dos comandantes mais respeitados do pelotão. O motivo de minha reflexão é o (longo) texto escrito pelo Professor Pedro Rezende sobre a perda de Aaron. Talvez ele seja a pessoa mais capacitada para escrever as palavras da forma que escreveu, pois deve ser um dos grandes filósofos técnico-humanistas do país, e que ainda assim possui orientação religiosa protestante. Confesso que me emocionei com algumas das passagens escritas pelo professor.
Você deve estar se perguntando: se não conhecia esse cara, por que continua sentido com sua perda? Sugiro que dê uma lida nesse texto (em inglês). Estamos vivendo um período de grandes transformações sociais, e como não poderia deixar de ser, é preciso destruir o modelo social existente primeiro. A maior quebra de paradigma diz respeito justamente à maneira como podemos agir (e interagir) através da Internet. Fossem outros tempos talvez eu ficasse em casa vendo a guerra pela TV e achando tudo absurdo, mas a tecnologia me fornece armas para (tentar) fazer a diferença.
Os que acompanham o blog devem me considerar um pouco “sensacionalista” ao citar as corporações, operações, conspirações e outros “senões” do mundo digital, e certamente a maior parte da população não tem a mesma preocupação com o tema. O texto do professor Pedro citado acima traz um trecho impresso do jornal Valor Econômico com a seguinte frase grifada:
Para a OTAN, o surgimento de ativistas hackers pode levar a uma nova classe de conflitos internacionais entre esses grupos e nações…
Você sabe quem é a OTAN? Sim, aquela organização militar. Agora leia a observação do Professor Pedro sobre o tema:
O recado vem da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), aliança militar que inclui até a Turquia (no Mediterrâneo), e da qual se acham sócios ou donos os maiores executivos e financistas do complexo industrial-militar apontado pelo presidente Eisenhower depois da IIª Guerra Mundial. Para esses senhores da guerra, as fronteiras da guerra cibernética agora incluem, como alvos prioritários à caça, as neobruxas marcadas pelos serviços midiático-corporativos como hactivistas.
Sim, os hackers e hackativistas são as novas “bruxas” da (segunda?) revolução iluminista, marcada pelo humanismo exacerbado. A pergunta que cabe agora é: quando nos tornamos alvo? Qual é o momento em que a briga deixa de ser verbal, escrita em um blog com poucos acessos como o meu, e se torna real, quando uma pessoa é acusa de prisão por roubar algo que está em domínio público?
Aaron Swartz é a primeira vítima tangível da Ciberguerra, da qual também se tornam reféns Julian Assange e seu Wikileaks. Fossem em outros períodos da história humana uma bomba já teria caído sobre algum lugar e não existiria mais Wikileaks, mas a Internet e sua estrutura livre não permitem que isso aconteça. Contudo, o que impede que o próximo alvo tangível seja você?
Para finalizar esse texto, deixo aqui mais um trecho do professor Pedro Rezende para reflexão:
Guiado pelo humanismo o homem eventualmente se desarvora, tendo perdido seu rumo além da matéria, agora fiando-se no virtual para o seu vôo de Ícaro. Para quem aprende, com o filósofo Gilles Deleuze, que virtual não é antônimo de material, nem de real, mas é a indistinguibilidade entre o real e o irreal, esse desarvoramento se revela. Quando as promessas do mais cobiçado fruto cibernético se desvanecerem, soprados que serão por escassez alimentar e energética (estas reais), a desintegração consequente, agudizada por corrosão moral no coração do homem, indicará tempo de colheita na fazenda dos sonhos humanos.