Liberdade

A Ciberguerra e suas vítimas

Written by Eduardo Santos · 2 min read >

Ainda na esteira do caso Aaron Swartz, li uma daquelas que talvez tenha sido a mais simples e profunda manifestação de pesar pela sua morte, emitida na lista Transparência Hacker Brasil:

Soldier down

Sim, o sentimento é de estar em uma guerra e perder um dos comandantes mais respeitados do pelotão. O motivo de minha reflexão é o (longo) texto escrito pelo Professor Pedro Rezende sobre a perda de Aaron. Talvez ele seja a pessoa mais capacitada para escrever as palavras da forma que escreveu, pois deve ser um dos grandes filósofos técnico-humanistas do país, e que ainda assim possui orientação religiosa protestante. Confesso que me emocionei com algumas das passagens escritas pelo professor.

Você deve estar se perguntando: se não conhecia esse cara, por que continua sentido com sua perda? Sugiro que dê uma lida nesse texto (em inglês). Estamos vivendo um período de grandes transformações sociais, e como não poderia deixar de ser, é preciso destruir o modelo social existente primeiro. A maior quebra de paradigma diz respeito justamente à maneira como podemos agir (e interagir) através da Internet. Fossem outros tempos talvez eu ficasse em casa vendo a guerra pela TV e achando tudo absurdo, mas a tecnologia me fornece armas para (tentar) fazer a diferença.

Os que acompanham o blog devem me considerar um pouco “sensacionalista” ao citar as corporações, operações, conspirações e outros “senões” do mundo digital, e certamente a maior parte da população não tem a mesma preocupação com o tema. O texto do professor Pedro citado acima traz um trecho impresso do jornal Valor Econômico com a seguinte frase grifada:

Para a OTAN, o surgimento de ativistas hackers pode levar a uma nova classe de conflitos internacionais entre esses grupos e nações…

Você sabe quem é a OTAN? Sim, aquela organização militar. Agora leia a observação do Professor Pedro sobre o tema:

O recado vem da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), aliança militar que inclui até a Turquia (no Mediterrâneo), e da qual se acham sócios ou donos os maiores executivos e financistas do complexo industrial-militar apontado pelo presidente Eisenhower depois da IIª Guerra Mundial. Para esses senhores da guerra, as fronteiras da guerra cibernética agora incluem, como alvos prioritários à caça, as neobruxas marcadas pelos serviços midiático-corporativos como hactivistas.

Sim, os hackers e hackativistas são as novas “bruxas” da (segunda?) revolução iluminista, marcada pelo humanismo exacerbado. A pergunta que cabe agora é: quando nos tornamos alvo? Qual é o momento em que a briga deixa de ser verbal, escrita em um blog com poucos acessos como o meu, e se torna real, quando uma pessoa é acusa de prisão por roubar algo que está em domínio público?

Aaron Swartz é a primeira vítima tangível da Ciberguerra, da qual também se tornam reféns Julian Assange e seu Wikileaks. Fossem em outros períodos da história humana uma bomba já teria caído sobre algum lugar e não existiria mais Wikileaks, mas a Internet e sua estrutura livre não permitem que isso aconteça. Contudo, o que impede que o próximo alvo tangível seja você?

Para finalizar esse texto, deixo aqui mais um trecho do professor Pedro Rezende para reflexão:

Guiado pelo humanismo o homem eventualmente se desarvora, tendo perdido seu rumo além da matéria, agora fiando-se no virtual para o seu “vôo de Ícaro”. Para quem aprende, com o filósofo Gilles Deleuze, que “virtual” não é antônimo de “material”, nem de “real”, mas é a indistinguibilidade entre o real e o irreal, esse desarvoramento se revela. Quando as promessas do mais cobiçado fruto cibernético se desvanecerem, soprados que serão por escassez alimentar e energética (estas reais), a desintegração consequente, agudizada por corrosão moral no coração do homem, indicará tempo de colheita na fazenda dos sonhos humanos.

Written by Eduardo Santos
Desenvolvedor Open Source por vocação, Mestre em Computação Aplicada pela Universidade de Brasília (UnB), professor universitário e cientista de dados (data scientist). Profile

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